

Tive a oportunidade única de deixar o verão na Suíça e vir para as Olimpíadas, em pleno inverno carioca.
Meu Suíço trabalha com esportes e eu, sortuda, virei acompanhante dele. Como acompanhante, estive em alguns importantes eventos esportivos além de Olimpíadas em Londres, Sochi, Lillehammer e agora Rio.
Estava apreensiva, claro. Sou brasileira. Moro em Lausanne, Capital Olímpica. Circulo entre experientes executivos de esportes. Acompanho notícias do Brasil. Não sou boba. Filtro, processo e absorvo diferentes opiniões. Haja coração!
Inverno no Rio se veste o que? A gente pode até ter dias mais frescos mas frio mesmo, aqui não faz não. Rio é Rio, flexível até nas estações.
Dias antes da abertura o óbvio: demos a cara para bater. Se todo mundo sabia que arrumar a Vila Olímpica seria possível escalando um monte de encanadores, pedreiros e faz tudo, porque não contrataram este pessoal 48 horas antes, evitando que o alarde da Austrália, EUA e Argentina chegasse aos quatro cantos do mundo?
Cheguei preocupada e defensiva. Brasil em crise, opiniões divididas, crise econômica, social, política e moral. Não achei que seria fácil.

E então fomos para a abertura.
Da Barra para o Maracanã, seguimos em quatro ônibus. O percurso não foi demorado para nós, privilegiados pelos batedores que com sirenes estridentes e motos mil paravam o transito e abriam passagem. Coisas do Brasil, não sempre compreensíveis e necessárias em outras democracias.

O silêncio dentro do ônibus era contemplativo. Pela janela, a realidade das favelas mostrava a pobreza evidente que contrastava com o por do sol alaranjado, com aquelas cores que só encontramos no Brasil. Os cliques quebravam a quietude.
No Maracanã fomos recepcionados por um coral de crianças simples, cantando músicas brasileiras e estrangeiras. Transbordavam emoções. As crianças dançavam, sorriam, pulavam. Estavam radiantes. Conquistaram e contagiaram os gringos, que sem perceber deixaram invadir seus corações.

E ai começou a festa.
Não preciso comentar o que já foi exaustivamente comentado. O Brasil arrasou na abertura.
Acertamos principalmente por não tentarmos ser nada além de brasileiros.

Abusamos das cores, dos ritmos e da segurança de sabermos fazer festas como ninguém. Valorizamos nossas raízes, nossos atletas, nossa Gisele, nossos músicos. Fomos simples e criativos. Mostramos o Brasil brasileiro. Este Brasil, que não tem como não adorar.
E contagiamos os gringos com a nossa maneira de ser.
Ouvi de um estrangeiro que foi festa para brasileiro. E é claro que foi. No Brasil, é pra ser brasileiro. Se eles quisessem festa europeia, teriam ficado por lá. Aqui é Brasil, aqui é do nosso jeito! Acertamos na mosca.
Fui dormir feliz. Rouca, mas feliz.

No dia seguinte foi dia de boteco. Sim, restaurantes chique são encontrados em qualquer lugar. Queria mostrar aos meus amigos gringos o charme de um boteco carioca. Sabia que não resistiriam a uma boa empada, aipim frito, escondidinho de carne seca com um chopp bem gelado.

Embalada pela caipirosca de lima da persia, lembrei a eles que somos um país em desenvolvimento vivendo nossa pior crise. Disse que diferente da Suíça, que votou contra sediar os jogos olímpicos, recebemos as Olímpiadas sem sermos consultados. Decidiram por nós. Afirmei que estamos com a moral baixa, todo mundo cansado de assistir um desfile de escândalos sem fim. Vivemos a decepção de um partido que iludiu e se corrompeu selvagemente. Brasileiros polarizados pelas diferenças ideológicas e oportunidades sociais. Guerra diária, violência e insegurança por todos os lados. Nenhuma perspectiva de melhora. Finalmente expliquei que a abertura dos jogos do Rio trouxe de volta o orgulho de ser brasileiro, algo esquecido nos últimos dois anos.
Foi mágico. Despolarizante. Emocionante. Empolgante.
Ainda tem muita coisa pra arrumar, fazer funcionar, ajeitar. Mas sem dúvidas, começamos muito bem!